17 de janeiro de 2014

Antonin Artaud: La recherche de la fécalité [A procura da fecalidade]

La recherche de la fécalité  faz parte de Pour en finir avec le jugement de dieu, publicado pela editora K em 1948. O contrato foi assinado com a editora em 12 de fevereiro de 1948, poucos dias após a proibição da emissão do poema no rádio. Junto a esse post, segue o áudio em que Artaud lê o poema, com cortes e alterações que o próprio autor recomendou para a difusão sonora.



A busca da fecalidade
Tradução: Thiago Mattos

Onde cheira a merda
cheira a ser.
O homem poderia muito bem não cagar,
não abrir a bolsa anal,
mas escolheu cagar
como teria escolhido viver
em vez de aceitar viver morto.

É que para não fazer cocô,
teria que aceitar
não ser,
mas não pôde decidir perder
            o ser,
isto é, morrer vivendo.

Tem no ser
alguma coisa particularmente tentadora para o homem
e essa alguma coisa é justamente

                        O COCÔ.
                  (Aqui, rugidos.)

Para existir basta se abandonar ao ser,
mas para viver,
tem que ser alguém,
para ser alguém,
tem que ter um OSSO,
não ter medo de mostrar o osso,
e nem ter medo de perder a carne.

O homem sempre gostou mais da carne
do que da terra dos ossos.
É que só tinha a terra e o osso,
e ele teve que ganhar a carne,
só tinha o ferro e o fogo
e nada de merda,
e o homem teve medo de perder a merda
ou na verdade ele desejou a merda
e, para isso, sacrificou o sangue.

Para ter merda,
isto é, carne,
lá onde só tinha sangue
e ferro-velho de ossos
e onde não tinha o que ganhar
mas só o que perder, a vida.

o roche modo
to edire
diz a
tau dari
do padera coco

Aí o homem se retirou e fugiu.

Então os bichos o comeram.

Não foi um estupro,
ele se prestou à obscena refeição.

Encontrou aí um gosto,
aprendeu ele mesmo
a ser bicho
e a comer o rato
delicadamente.

E de onde vem essa imunda abjeção?

Do homem não ter ainda se constituído,
ou do homem só ter uma pequena ideia do mundo
e querer eternamente guardá-la?

Isso vem do fato de que o homem,
um belo dia,
parou
               a ideia do mundo.

Dois caminhos se ofereciam:
o do infinito de fora;
o do ínfimo de dentro.

E ele escolheu o ínfimo de dentro.
Aí onde só se pode espremer
o rato,
a língua,
o ânus
ou a glande.

E deus, o próprio deus, espremeu o movimento.

Deus é um ser?
Se não é, é merda.
Se não é um ser,
não é.
Ora, ele não é,
a não ser como o vazio que avança com todas as formas
cuja representação mais perfeita
é a caminhada de um grupo incalculável de piolhos.

“Você é louco, senhor Artaud, e a missa?”
Nego o batismo e a missa.
Não existe ato humano
que, no plano erótico interno,
seja mais pernicioso do que a descida
do suposto Jesus Cristo
sobre o altar.

Não vão acreditar em mim
e vejo daqui o público levantando os ombros
mas o  chamado cristo não é mais do que aquele
que de frente para o piolho deus
aceitou viver sem corpo,
enquanto um exército de homens
descidos de uma cruz,
onde deus achava que estavam há muito tempo pregados,
se revoltaram,
e, armados com ferro,
com sangue,
com fogo, com ossos,
avançam, xingando o Invisível
a fim de acabar com o JULGAMENTO DE DEUS.



La recherche de la fécalité
In: ARTAUD, Antonin. Pour en finir avec le jugement de dieu. Paris: Gallimard, 2003.

Là ou ça sent la merde
ça sent l'être.
L'homme aurait très bien pu ne pas chier,
ne pas ouvrir la poche anale,
mais il a choisi de chier
comme il aurait choisi de vivre
au lieu de consentir à vivre mort.

C'est que pour ne pas faire caca,
il lui aurait fallu consentir
à ne pas être,
mais il n'a pas pu se résoudre à perdre
                      l'être,
c'est-à-dire à mourir vivant.

Il y a dans l'être
quelque chose de particulièrement tentant pour l'homme
et ce quelque chose est justement

LE CACA.
   (Ici rugissements.)

Pour exister il suffit de se laisser aller à être,
mais pour vivre,
il faut être quelqu'un,
pour être quelqu'un,
il faut avoir un os,
ne pas avoir peur de montrer l'os,
et de perdre la viande en passant.

L'homme a toujours mieux aimé la viande
que la terre des os.
C'est qu'il n'y avait que de la terre et du bois d'os,
et il lui a fallu gagner sa viande,
il n'y avait que du fer et du feu
et pas de merde,
et l'homme a eu peur de perdre la merde
ou plutôt il a désiré la merde
et, pour cela, sacrifié le sang.

Pour avoir de la merde,
c'est-à-dire de la viande,
là où il n'y avait que du sang
et de la ferraille d'ossements
et où il n'y avait pas à gagner d'être
mais où il n'y avait qu'à perdre la vie.

o reche modo
to edire
di za
tau dari
do padera coco

Là, l'homme s'est retiré et il a fui.

Alors les bêtes l'ont mangé.

Ce ne fut pas un viol,
il s'est prêté à l'obscène repas.

Il y a trouvé du goût,
il a appris lui-même
à faire la bête
et à manger le rat
délicatement.

Et d'où vient cette abjection de saleté ?

De ce que le monde n'est pas encore constitué,
ou de ce que l'homme n'a qu'une petite idée du monde
et qu'il veut éternellement la garder ?

Cela vient de ce que l'homme,
un beau jour,
a arrêté
l'idée du monde.

Deux routes s'offraient à lui :
celle de l'infini dehors,
celle de l'infini dedans.

Et il a choisi l'infime dedans.
Là où il n'y a qu'à presser
le rat,
la langue,
l'anus
ou le gland.

Et dieu, dieu lui-même a pressé le mouvement.

Dieu est-il un être ?
S'il en est un c'est de la merde.
S'il n'en est pas un
il n'est pas.
Or il n'est pas,
mais comme le vide qui avance avec toutes ses formes
dont la représentation la plus parfaite
est la marche incalculable d'un groupe de morpions.

"Vous êtes fou, monsieur Artaud, et la messe ?"

Je renie le baptême et la messe.
Il n'y a pas d'acte humain
qui, sur le plan érotique interne,
soit plus pernicieux que la descente du soi-disant Jésus-Christ
sur les autels.

On ne me croira pas
et je vois d'ici les haussements d'épaules du public
mais le nommé christ n'est autre que celui
qui en face du morpion dieu
a consenti à vivre sans corps,
lors qu'une armée d'hommes
descendue d'une croix,
où dieu croyait l'avoir depuis longtemps clouée,
s'est révoltée,
et, bardée de fer,
de sang,
de feu, et d'ossements,
avance, invectivant l'Invisible

afin d'y finir le JUGEMENT DE DIEU.


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